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Yara Frateschi

Mulheres, raça e classe: a pandemia aprofundando desigualdades

Ao contrário do que pensa Giorgio Agamben, a sociedade acometida pela pandemia não é uma "massa compacta e passiva"* , mas composta por pessoas portadoras de distintos marcadores sociais e que vivem os efeitos da pandemia em conformidade com as distintas maneiras pelas quais interseccionam classe, raça e gênero, etnia, sexualidade, idade.

Levando em consideração que as sociedades capitalistas, machistas e racistas são profundamente desiguais em termos de classe, gênero e raça, eu proponho na live com o Mario Vitor Santos (link abaixo) uma reflexão sobre a pandemia no Brasil a partir daí, ou seja, a partir das desigualdades e violências já existentes.

Como a pandemia e a necessidade (inconteste) do isolamento social impacta a vida das mulheres em geral, se sabemos que o trabalho de reprodução social é profundamente mal dividido em detrimento das mulheres?


Como a pandemia e o (necessário) isolamento social impacta a vida das mais de 57 milhões de mulheres chefes de família (ou seja, de cuja renda depende o sustento da família)? E se levarmos em consideração que 57% das famílias chefiadas por mulheres estão abaixo da linha da pobreza, das quais 65% são chefiadas por mulheres negras. Como a pandemia afeta a vida das 5,7 milhões de empregadas domésticas, das quais 3,7 milhões são negras e pardas? E se lembrarmos que 50% do trabalho no Brasil é informal e que as mulheres são maioria na informalidade?

Vamos falar das mulheres mais afetadas pelo necessário isolamento social: as que precisam do dia de trabalho para alimentar a família inteira.

Se levarmos em consideração a violência doméstica, veremos que o isolamento social significa para muitas mulheres o convívio 24h com o seu abusador ou provável assassino. Só em SP o número de mulheres assassinadas em casa neste último mês de isolamento social dobrou: dobrou!

Ou seja, a pandemia e as maneiras necessárias de controlá-la não são sentidas e vividas da mesma maneira sem distinção de gênero, raça e classe, pois precariza vidas já precárias (Judith Butler) e expõe todas as incapacidade do neoliberalismo em garantir o básico para a maioria das pessoas (Angela Davis).

Convencida de que é muito difícil pensar na tempestade e de que os significados, que a filosofia procura, precisam de tempo e distanciamento para aparecer, resigno-me por ora a um exercício de pensamento em diálogo com as outras ciências - médicas, sociais, econômicas - e ancorado em experiências concretas de vida. A filosofia prática - política e ética - que se furta à concretude é mera especulação vaidosa, mais preocupada consigo mesma do que com o mundo que diz tentar explicar.

PS: Loiane Prado e Giovana Facciola, em breve trago aqui um texto para dialogar com o de vocês (https://www.filosofas.org/post/a-pandemia-do-novo-coronav%C3%ADrus-e-a-leitura-de-giorgio-agamben) sobre os artigos do Agamben publicados na Quodlibet sobre a (invenção da) pandemia.

*Conferir artigo publicado por Agamben no dia 06 de março, o segundo dos cinco artigos que ele publicou sobre a (invenção da) pandemia https://www.quodlibet.it/giorgio-agamben-distanziamento-sociale.


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