O GT de Filosofia e Gênero da ANPOF vem a público repudiar a violência patriarcal que ceifou a vida de Janaína Bezerra, estudante da UFPI. Assim, o GT subscreve a nota publicada pelo NUPEC (Núcleo de Pesquisa Sobre Crianças Adolescentes e Jovens) da UFPI. A seguir, a nota na íntegra:
"É com muita indignação e revolta que lemos a notícia do brutal assassinato da jovem Janaína Bezerra da Silva, mulher negra e estudante de jornalismo, ocorrido no interior da sala de aula do Departamento de Matemática da UFPI, dia 28.01.2023. A estudante participava de calourada na UFPI, evento tradicional, organizado pelos jovens estudantes, por meio de seus Centros Acadêmicos ou do Diretório Central dos Estudantes.
Na UFPI, as calouradas sempre existiram e tem como propósito trocas de experiências, encontros, emoções, afetos, solidariedades, animação. Afinal de contas, como uma universidade pode conviver com as juventudes desprezando suas formas de sociabilidades para além da sala de aula? As festas, ao contrário do que se propaga, não são “balbúrdias” e sim espaços de aprendizagens, de formação, de convívio, de afetividades, de humanidades!
Por essa razão, preocupa-nos os rumos que o debate toma quando vem a público o feminicídio de uma jovem estudante mulher negra em que a “insegurança” é adotada como elemento central e não a “violência” sofrida! As mulheres não estão seguras na sociedade em que o machismo está entranhado. As mulheres cotidianamente violentadas. As mulheres sempre estão em alerta!
As mulheres sempre estão na mira da violência fomentada pela estrutura machista, misógina, racista! Uma realidade que foi potencializada no governo fascista de Jair Bolsonaro, em que a violência tomou lugar privilegiado na gestão do Estado.
O abuso, o assédio e as variáveis das violências contra mulheres são cotidianas na sociedade, no interior das instituições, a exemplo da UFPI. E, lutando contra as violências às mulheres no interior da UFPI, nós, do NUPEC, desde 2015, pautamos o debate e fortalecemos a luta. A primeira experiência foi por meio do Projeto de extensão: Assédio Sexual na UFPI: construindo uma reflexão crítica sob a perspectiva dos estudantes e, recentemente, incorporamo-nos ao Observatório da Segurança Pública-Piauí, com objetivo
de mapear, denunciar e lutar contra qualquer forma de violência contra as populações jovens LGBTQIA+, mulheres, pessoas negras em nosso Estado e na UFPI.
É importante ressaltar que algumas IES, já conscientes da gravidade dentro das universidades, da dominação de gênero e do racismo, vêm tomando medidas para enfrentá-los; como a UFSCar, que criou em 2014, uma “Comissão” para apurar denúncia de assédio relatada por estudantes; a UFRural do Amazonas, que desde 2016 discute o tema e nesse mesmo ano lançou um “Guia Informativo” (https://ceu.ufra.edu.br/images/infoII.pdf); a UFAL, que tem um projeto em desenvolvimento, desde 2016, visando criar uma “Política Institucional de Combate ao Assédio na Instituição”, e que lançou uma “Cartilha” em 2018 e, ainda, a UFES, que constituiu uma “Comissão” em 2018. E, na UFPI, como temos enfrentado a cultura patriarcal que trata as mulheres como objetos descartáveis? Em geral, à medida que anunciamos as violências contra as mulheres, sejam elas estudantes, sejam técnica-administrativas, sejam professoras, têm-se como resposta o destrato, a chacota, a
desqualificação, inclusive por pares que consideram ser esse um tema “menor”. Enquanto isso as violências seguem silenciadas, amordaçadas.
As violências que ceifaram a vida da jovem mulher negra, a discente Janaína Bezerra da Silva, não pode ser apenas um número a mais nas contas das estatísticas do feminicídio no Piauí, na UFPI. Para além de culpar as práticas juvenis no interior da UPFI, é preciso desenvolver amplo debate, mobilizar a comunidade universitária, responsabilizar gestões no âmbito da UFPI, dos municípios, do Estado e da sociedade em geral, para juntos
enfrentarmos a realidade que mata jovens, mulheres, pessoas negras e pobres como alvos prioritários. Para lutarmos contra o feminicídio e o juvenicídio em nosso Estado. Precisamos de ações concretas, políticas públicas sérias que incidam contundentemente nas práticas sociais, culturais, educativas da sociedade.
A luta anti-machista, anti-misógina, antirracista tem que ser cotidiana na sociedade e no interior das instituições. E, a saída não é individual, mas coletiva. Precisamos nos juntar, ocupar os espaços públicos, torná-los espaços vivos e de vivências e sociabilidades plenas.
Teresina-Piauí, 29 de janeiro de 2023"
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